“POR QUE NÃO HÁ UMA DANÇA CLÁSSICA BRASILEIRA”
Muitas pessoas, sinceramente, pensam que seja algo de outro mundo a afirmação que uma dança qualquer, qualquer uma, seja mais do que um simples entretenimento, uma diversão. Toda dança, e a partir de agora a chamaremos pelo nome correto, coreografia, está sempre expressando, dizendo ou tentando nos dizer algo que do ponto de vista do coreógrafo, o verdadeiro artista e autor da dança deseja que compreendamos.
Se você ler um livro, contendo diversos capítulos, será normal compreender cada capítulo bom como o assunto, o tema do livro. Semelhantemente, uma coreografia possui uma abordagem, um tema intencionalmente explorado, um assunto que pode expressar o significar muitas coisas. Pode induzir à alegria, expressar coragem, energia, confronto de ideias, desafios, humor e até expressar tristeza ou melancolia. Desse modo, um texto contendo uma narrativa qualquer: pode ser criativamente verdadeiro; criativamente mentiroso; agradável de se ler ou de ouvir sendo lido. De um modo ou de outro estará tentando nos comunicar algo, às vezes de modo mais objetivo, às vezes de modo mais subjetivo, mas sempre estará nos dizendo algo.
Se a dança tem sempre algo a nos dizer, vejamos alguns poucos exemplos dentre incontáveis a serem ditos, entretanto, antes disso, entendamos que uma religião, uma ideologia politica geralmente nacional pode declarar um determinado gênero de dança, não recomendável por algum motivo que entendam. Não estamos defendendo nenhuma posição, estamos apenas registrando que naturalmente ocorrem. Quando não há esses freios sociais, uma dança pode descambar pra algo pernicioso e indesejável, que pode incidir e geralmente redunda em uma perversão das gerações mais jovens.
As danças são separadas tecnicamente, por tipo de danças ou gêneros de danças. O objetivo foi promover uma identificação colocando-as em categorias como tipo e gêneros de danças, com seus nomes, às vezes mais de um para uma mesma dança. Isso relativamente ajuda nos a separá-las entre si, uma das outras, como ajuda a compreender suas semelhanças e diferenças, bem omo algo mais importante e basilar: a intenção. Uma coreografia é constituída de gestos e evoluções, é praticamente semelhante a um texto de um livro, separado ou constituído de capítulos. O que amarra tudo isso é a intenção que no livro é justamente o tema, o assunto que o autor se propôs a falar e a expressar tudo o que aparece no seu livro. Assim é também na coreografia da dança.
As danças populares são por sua natureza mais passageira e os temas nelas expressos ou explorados são muito mais localizados, seja no tempo ou regionalmente. O que faz com que as danças populares sejam tão mais bem quistas e cultivadas são o fato de sempre funcionarem como simples entretenimento e na visão das pessoas não mais do que isso. Elas nascem e e se estruturam dentro de um recorte também social e econômico e são muito rapidamente substituídas por outros gêneros de dança, quase sempre ligados a um gênero ou ritmo musical, também regional de gueto.
Já, as danças chamadas de clássicas ou de danças eruditas, ao contrário, não surgem de forma mais elaborada e exatamente, tendo uma existência prolongada pelo temo, atravessando incontáveis gerações, sobrevivendo a influências culturais externas e permanecendo fiéis a si mesmas. O que transmitem ou o que intentam transmitir é mais universal do que local, de forma que a compreensão e absorção de suas mensagens e ideias são absorvidas além de seus limites regionais ou nacionais, sendo reconhecidas com uma experiência humana comum e não apenas temporária.
Embora, como já dito, sejam passageiras e tenham o seu sucesso determinado por modismos movidos por intenções da indústria e da mídia em um grande conluio, têm todas intencionalmente uma mensagem que pode ser séria, de protesto ou provocativa, irônica, cômica. Em todos os casos podem ser e são portadoras de mensagens a serem entendidas, compreendidas.
O "funk", por exemplo, cujo nome tem origem na palavra inglesa com significado antigo de estar embaralhado, na gíria mais recente, "to funk" significa deixar confundido, chocado, "sem graça". Logo o ritmo, a dança, bem como as letras das canções não podem ter outra intenção a não ser de chocar quem ouve quem vê a dança ou quem ouve a letra de uma canção. Nesse contexto, tanto o original da briga de guangues e disputas entre jovens de bairros vizinhos e inimigos como os de hoje dos bailes de jovens intencionalmente rebeldes, a sua mensagem deve ser entendida.
Tomemos agora o tango, uma dança de origem argentina, bem ao sul do Brasil após o Uruguai. Uma dança, e um gênero musical que a acompanha e sustenta, nascida nos ambientes boêmios noturnos de Buenos Aires. Registra, retrata nos pares de bailarinos, a relação de flerte entre homens e mulheres em um jogo de provocações e respostas que é basicamente um fenômeno universal. As performances ou coreografias terminam com assentimento da dama ou negação da virtual relação, exatamente como deveria ser na vida real, que contrariamente mulheres ao dizerem não a seus parceiros ou são espancadas ou covardemente mortas.
O balé, é considerado uma dança clássica ou erudita. A sua classificação e reconhecimento preenche totalmente e satisfaz todas as expectativas relacionadas à danças clássicas. Possui uma sofisticação técnica, física. Uma profundidade ideológica e filosófica e não é praticamente afetada por modismos, modernismos ou invenções que a descaracterize. Reflete muito bem, a relação de proteção, auxílio e apoio que homens devam ter em relação às mulheres como parceiros na vida e diante dos desafios que a vida impõe a ambos. Trata-se de um registro e de uma visão madura da realidade. As estórias e narrativas que são usadas no balé para expressar ideias, anseios e descrever a realidade são apreensões igualmente universais. Qualquer pessoa em qualquer lugar do mundo, em diferentes culturas, podem entendê-las e usufruí-las igualmente.
Uma das respostas, é que o Brasil como nação e cultura, é bastante jovem e que a sua própria cultura não é originalmente sua, mas um "mixer", uma mistura sem ser uma síntese que gere uma cosmovisão própria que implique numa identidade nacional. Essa mistura, além de não colaborar, não tem produzido algo teoricamente novo e nosso. Em outras culturas ideias e cosmovisões próprias surgem, amadurecem e constituem uma identidade e uma aquisição que se torna objeto de permanência e transmissão às novas gerações.
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